Não vou para a rua andar. Não gosto de andar se não tenho um destino ou se o destino é o próprio passeio. Assim fico e, por aqui, vou passando por ti e por outros que recordo desde há muito tempo. Passo também por pessoas que nem conheço, ilusões de perfeição, pessoas tão fantásticas que nem me vêem. Quanto custaria uma operação plástica à humanidade? Perco-me em contas e adormeço ao pontapé. Durmo e choro, acordo e perdoo, lembro-me que não chorei sem ser no sonho e que gostava de o fazer. Sinto que a impressão que tenho na barriga desapareceria se chorasse mais. É claro que já chorei, isso não é difícil, mas sozinho não. Há qualquer coisa de dramático no choro e que só funciona quando estou acompanhado… com público. Lavo-me dessa chuva e penso no que virá: Eu a dizer: “Lembro-me daquele dia no metropolitano em que nos despedimos com um olhar prolongado. Tu a leres e a levantares o olhar por um instante e eu cá fora (portas a fechar) a seguir o comboio com os olhos. Pensei que não te tornaria a ver, mas as rotinas de uma grande cidade ajudaram o nosso destino.” Tu, mais calada, simplesmente sussurrando um sorriso, apertas-te mais no meu peito e adormeces. Fica o silêncio. Por agora sonho. Sei que não o devo fazer, até porque consigo ver aquele olhar em ti que não percebo. Passaram apenas poucos dias e é difícil para mim saber o que pensar. Acho que é por isso que eu quero chorar.
(João Freire)
Texto Reeditado para o tema "Silêncio" num desafio da "Fábrica de Letras".
30/08/2007
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33 comentários:
Um história de amor...de desopedida...deixa-nos quse sempre entregues ao choro e consequentemente ao silêncio perante os outros, os que estão fora dessa redoma.
Amei o ponto´em que dizes que há alguma coisa de dramático em chorar. Verdade, mesmo!! É uma coisa que se faz sózinho com muito mais facilidade, mas que com um público atento é uma fonte imnersgotável. Pá isto é um bocado irónico, mas o que se há-de fazer.
Beijos Joãozinho, mais uma vez muita sendibilidade por parte de um homem. Surpreende-me sempre isso.
Há vários preconceitos neste teu comentário, querida (a condescendência do querida é propositada) Mel:
Desde logo, o preconceito de que sou homem :), mas essencialmente o preconceito de que os homens não são sensíveis... que homens é que tu conheces, Mel?
(e há uma nuance na tua análise: não é uma despedida, é um começo com dúvidas)
Claro que os homens são sensíveis. Erradamente escondem que o são, que não é o teu caso. Johnny li este teu post, maravilhoso, com uma mensagem de amor sublime, e dei comigo a pensar:
Será que ela a lerá? Quero com isto dizer que me pareceu real, dirigida a alguém, alguém que não esqueces, alguém que muito amas, alguém que esperas.
Neste caso, é um silêncio cheio de interrogações e angústias. Gostei e também acho que os homens têm uma enorme sensibilidade, quase tão grande como a sua arte para a disfarçar em público.
Que emoções/sentimentos se traduziam nesse tal olhar demorado? Ainda bem que houve um reencontro... mas com palavras por dizer!
A realidade não é tão romântica, Mary, a realidade é de alguém que se apaixona num metropolitano por alguém que olhou mais do que um mero olhar, mais do que um segundo, num olhar prolongado que, ao fechar das portas, deixa as pessoas cheias de interrogações e angústias, como a Teresa diz, mas apenas isso. Morreu aí, na realidade nunca mais se viram (acho que há uma história de alguém que fez uma página na internet à procura de alguém que viu no metro, mas não é esta) e ficou apenas um exercício do que o que seria mais à frente (comigo) e o que seria (comigo) seria... mais interrogações e angústias :)
Juana, não sei. Uma pessoa quer sempre pensar que gostou do que viu, mas como não faz nada... de que adianta pensar? Na realidade não houve reencontro.
Quanto à questão da sensibilidade, não vamos mais por aí antes que comecem a pôr a minha masculinidade em jogo :)
Então chora. O choro liberta... umas murraças também, mas não é disso que agora se fala.
Tá muito bom (muito giro :p).
*
Obrigado, Ginger!
o choro de vez em quando faz bem, limpa a alma e as areias dos olhos. :P
Um silêncio que pensa nela aconchegada e adormecida em teu peito...maravilhoso! Linda participação e silêncio!abraços,chica
Amaterasu, é mais difícil do que parece.
Chica, dos melhores silêncios :) Obrigado.
Já vi a minha dose de homens chorarem... não teve nada de mais... tinham público lá está... mas tenho a profunda convicção que o fizeram também em privado... talvez essa vontade de chorar se deva a outra, que não essa do metro... para dizer a verdade, fiquei confusa, ou é de mim (agora estou como tu, brown Eyes, rrss)parecia um amor perdido coisa intensa e vens dizer que afinal não... mas e essa intensidade dramática que pretendes sentir, será por isso mesmo, por não ser nada demais..e quereres que fosse? Olha... não ligues, rrssss gostei do texto, mas deixou-me confusa (I'm a romantic at heart, you know...), devo ser eu :)Bjo
Eva, mal de mim se com 29 anos não tivesse desgostos de amor, basta leres os textos que tenho com a etiqueta "doce lado amargo" para veres isso, mas neste caso, escrevi baseando-me numa rapariga que vi no metro de Lisboa e que trocou olhares comigo. Já não sei há quanto tempo foi, mas foi assim: a primeira parte real e a segunda, a a partir do reencontro, imaginada... ainda que baseada noutras coisas pendentes, como sempre... como toda a gente.
o choro em silêncio. uma das formas de "nos emprestarmos" um ombro. sozinhos, com público, tanto faz (eu quando "tenho que chora, choro mesmo esteja eu onde estiver, e depois, quando a fonte secar, parou! Não choro mais por aquilo que já choreis. Faz-me sempre bem. Chora em lágrimas silenciosas e discretas... mas recorda também o sorriso sonhado...
Belo texto johnny!
Beijinho**
Cada um de nós vê no seu ponto vista está questão do silencio.
Acredito é que não podemos mais nos calr diante das injustiças. o Silencio de todas as faces para as suas interpretações..
Para cada situação, uma maneira de ver as coisas..
Ele existe em todos os nossos sentidos de vida..
Seu trabalho ficou muito. Muito bom..Gostei.
Venha me visitar..Também estou participando. http://sandrarandrade7.blogspot.com
Deixo o convite para ser meu mais novo seguidor, caso gostares daquele blog.Apreoveite para conhecer os demais.
Ficarei muito feliz.Carinhosamente,
Sandra
Bem...
Quase estou sem palavras.
De todos os teus textos este foi, sem dúvida, o que mais me tocou profundamente.
Penso em como 'navegar' nos teus pensamentos enquanto escrevias isto devia ser uma experiência arrebatadora e ao mesmo tempo assustadora.
Poucas linhas e no entanto tão sentidas, tão marcantes.
Quanto à história em si, só posso dizer que é no silêncio que nos conseguimos encontrar a nós e aos outros de forma honesta e transparente... e foi no silêncio que ele a encontrou novamente.
beijos
Se tiver um destinatário real espero que seja lida em voz alta, quebrando o silêncio :) Gostei bastante.
Ui jóni....também não é preciso ser tão sensivel.
Meu querido (é condescendencia, mesmo) não há qualquer preconceito no meu comentário, és homem ponto final. Sobre o facto de os homens serem sensiveis, claro que são, e não me lembro de em parte nenhuma me teres "ouvido" dizer isso. Agora o que também não podes negar, é que há homens, e há mulheres e têm diferenças que se traduzem de muitas maneiras, e na escrita não é diferente. podes até achar que sou machista e assim, mas wtv, a minha mãe também era...
Beijos Jóni
Ps: E os homens que eu conheço....nem queiras saber ;D
A chorar afogas aquilo que a dor da despedida te proporcionou... Chorar é por vezes um desabafo quase mudo, mas que muitas vezes alivia*
Gostei do texto, para não variar =)
Eu choro por tudo e por nada, até com anúncios de televisão, mas foi bonito 'ler' palavras tão emotivas e francas, vindas de um homem. os homens tendem em esconder a sensibilidade e as emoções. Confesso que ainda não consegui perceber porquê. E estou com a Brown Eyes, espero que ela leia esta mensagem. Vai chorar de certeza. Eu quase chorei...
Beijinhos :)
Lala, custa... não quer dizer que não tenha chorado ou venha a chorar, mas ultimamente tem custado mais, o que também pode ser bom sinal :)
Sandra, vou estar de olho em ti e depois digo alguma coisa, pode ser?
Su, apenas - que já é muito - obrigado. Fico babado.
Fia, vai tendo... duas ou três destinatárias, mas a história, como disse, pelo menos no que respeita à segunda parte (a melhor parte), é invenção.
Mel, concordo com as diferenças, não de sexo, mas de pessoa para pessoa, diferenças que, no meu entender têm de ser bem discutidas (a não ser que, por causa das diferenças, ela não goste de as discutir) imagino os homens que alguém que diga "nem queiras saber" conheceu :)
Alivia, Por entre o luar, mas é idiota:)
Helga, não tenho nada contra quem chora (para além do facto de ter dito que era idiota chorar :), mas admito que haja gente que tem dificuldades em fazê-lo. Desconfio que "ela" não vai ler.
Confesso que me senti confuso numa determinada parte do que escreveste, culpa do sono e dos meus 2 neurónios cansados a esta hora da noite.
Gostei imenso dessa saraivada de ideias do texto e, principalmente, do final. Fico com uma pergunta: és tu o personagem ou é tudo ficção?
Vocês não lêem os comentários, pá.
A primeira parte é ele a pensar para si em coisas banais, "que não gosta de andar", bla, bla, bla... alienação, incompreensão, etc.
Depois, a segunda parte é ele a pensar o que lhe dirá a ela no futuro, sobre como se conheceram e sobre as dúvidas que ele teve, imaginando ele que ela, quase sem ligar ao que ele diz, confia no que sente (porque ele é tão bom) e apenas adormece.
Por último, faz um balanço terra-a-terra do que é a realidade, ou seja: "passaram-se só uns dias porque é que eu estou a pensar nesta treta toda."
Quanto à realidade, não existe. Existem várias vezes em que um gajo pensa: aquela olhou e parece simpática e está a ler um livro e se um gajo falasse... mas enquanto um gaja pensa, as portas do metro fecham e a oportunidade esvai-se.
Johnny,
pensas no que virá...
Por agora sonhas, mas, e se tudo se concretizar?
Choras por medo de te apaixonares e não seres correspondido.Tens medo de sofrer.Por isso choras.
Diz que é isto... vá lá diz... Interpretei bem a tua ideia?
Deixa lá, eu li e entendi assim.
Acima de tudo gostei de NO SILÊNCIO teres focado as ilusões que se criam à volta de pessoas que não conhecemos.
bjo
Mz, não :)
Mas o que interessa é o que tu interpretas e o que isso faz por ti.
ÀS VEZES QUANDO QUEREMOS CHORAR É BOM QUE NINGUÉM NOS PRESTE ATENÇÃO...
BJS
Pedrasnuas, mas às vezes também é uma chamada de atenção :)
Oh...:( pronto, foi à minha maneira!
:)
MZ, :)
É doloroso andar só, imaginar a vida lá fora longe dessa mesma vida, chorar só no silêncio que não pedimos mas que nos foi imposto... pela pessoa que amamos. Apetece chorar, mas o silêncio impõe-se-nos muitas vezes.
Excelente paticipação
Natália, é verdade que a imaginação tem uma papel principal no choro e na desilusão, mas admito também que às vezes seja mais uma incapacidade de chorar do que uma imposição do silêncio... ainda que o resultado seja o mesmo: o silêncio.
Obrigado
Um texto cheio de verdades e de sentimentos pelos quais todos passamos, existem momentos que realmente se chorassemos parece que o peito ficava mais aliviado no entanto nem uma lágrima corre... Parabéns!
Exactamente, Olga, obrigado.
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