De Peniche a Lisboa, à noite, sozinho, com o volume da música a raiar o insuportável nada mais existe que o pensamento, a companhia que damos a nós mesmos e a única forma de termos uma conversa inteligente. Mas o que é que se pensa durante esta viagem?
Pensas, desde logo, que o gasóleo está caro, porque é impossível não pensar no preço dos combustíveis quando entras num carro e que os carros movidos a energias alternativas não conseguirão atingir as velocidades destes que agora existem e pensas que daqui a uns anos, por tudo isso, já não podes ir de forma tão frequente a Lisboa, aquela cidade que aprendeste a desfrutar, porque não a amaste quando a viste, mas no preciso momento em que disseste que a conhecias, como uma paixão mais madura, e a Braga, ao Baroque, ter com os idiotas dos teus amigos que não consegues deixar de amar.
Pensas nos amigos, velhos e novos e em como gostas deles todos.
Pensas no Bruno e na Mónica, que tardam em assentar.
Pensas no amor. Hoje és só amor e dizes a ti próprio: "és mesmo totó"
Pensas que devias ter oportunidade para fazer mais sexo. E porque não?
Pensas naquela, pensas naquela, claro! Nem que seja só aquele sentimento pequenino que há-de ficar para sempre e pensas também na possibilidade daquela, daquela, e ainda mais daquela. E ris. Rir faz-te lembrar daquela, que ri muito. Parece que está a gozar contigo, mas, se ela diz que não, tens de aceitar.
E depois ouves a música. Pensas que a letra de "God Hates a Coward" (Tomahawk) deve ser a letra mais espectacular que alguém alguma vez escreveu e cantas: "On the only piano, wrote the fuckin' concerto, shoot pool with your eyeballs, rack 'em up! Make a meal of your asshole, gnaw on your fat soul, dipping your heart in my vinegar." E depois ris novamente.
E estás bem. O ano está a começar bem e tu pensas que te sentes bem… nada de especial, mas (---------pausa---------) bem, um calmo, saudável e prolongadíssimo BEEEEEEEEEEEM!
Depois pensas no “passeio dos tristes”, a frase que a Patrícia (amiga da Lúcia) inventou para os fumadores que têm de ir, desde que começou o ano, fumar para a rua e pensas também que foram simpáticos em pagar-te o jantar.
(Obrigado Luís e Patrícia)
Depois já estás a entrar em Lisboa e tens de te concentrar para saíres no sítio certo, mas não consegues deixar de pensar na Cláudia Vieira que aparece no teu lado esquerdo à entrada da 2ª Circular num cartaz do tamanho de um prédio de três andares, vestida com uma lingerie vermelha e pensas que ainda há publicidade bem feita em Portugal, mas perigosa, depois obrigas-te a pensar em voltar a cabeça para a frente, gozas a música que tanto trabalho te dá a coleccionar e, finalmente, pensas como tu, mesmo que apareças morto num acidente brutal de viação – em que mais nenhum carro se envolveu sem ser tu -, mesmo que te assustes, mesmo que sofras e tenhas medo naqueles últimos instantes, morrerias a fazer uma das coisas que te deixa mais feliz, conduzir.
Banda sonora da viagem:
NIN - Hand That Feeds,
Ornatos Violeta - Chaga,
Nirvana (Sim, Nirvana. Só gosto desta. Dêem-lhe uma hipótese) - You Know You’re Right,
Pearl Jam - Porch,
Tomahawk – God Hates a Coward
Faith No More - The Gentle Art Of Making Enemies
Soundgarden - Pretty noose,
Entre outras das mais pesadas, que eu gosto de escolher para conduzir sozinho. Reparei que nesta colectânea das músicas para conduzir, só o Mike Patton repete e há mais com o seu dedinho mágico. Realmente, o Mike é um gajo genial.
(João Freire)
1 comentário:
gostei muito e tanto deste texto. bolas!
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