27/05/2008

Adam Smith

Agora o mercado já não é às segundas-feiras no Fundão. O mercado está centralizado nas bolsas, está descentralizado das pessoas e da realidade física. Nos mercados bolsistas olham para os números e eles não têm consequência nenhuma: São números.
Adam smith identificava duas leis essenciais do mercado: o interesse pessoal, na medida em que, por exemplo, o homem do talho não dá nada por bondade, e a concorrência, que impediria a crueldade na estipulação do preço. Sem indivíduos numa transacção económica não há crueldade. O liberalismo económico criou um monstro e esse monstro é a ausência de controlo na concorrência, isto é, a ausência de concorrência, pois todos os produtos funcionam num mercado próprio que age em cartel. Sem concorrência, ficamos com a tirania. Contudo, se até há pouco tempo, o mercado especulativo assentava num tipo de capital mais volátil, de serviços ou de produtos diferenciados, mais propícios ao investimento e ao lucro, como os bancos, as grandes empresas de comunicações ou de construção, com a propalada crise que se instalou no mundo os gestores viraram-se para o mercado das commodities, um mercado de produtos básicos e indiferenciados, como os cereais, o petróleo e todas essas coisas, no qual, devido à vasta divulgação e consumo de que os produtos que o constituem são alvo, qualquer alteração mínima do preço tem enormes implicações, pois se, por exemplo, houver um aumento dos cereais, isso resultará no aumento do preço das rações, que levará ao aumento da carne, que levará ao aumento… de tudo, basicamente! E depois dá a volta.
É claro que este mercado não dá para sempre, é claro que a especulação nestes produtos pode originar uma explosão no mundo económico com consequências exponencialmente superiores às da Grande Depressão ou da Crise do Petróleo, é claro que, por exemplo, pode originar uma crise humanitária de dimensões catastróficas e eles – refiro-me a “eles” como aqueles que lucram ou aqueles que só vêem números à frente sem se preocuparem com as consequências dos seus actos – sabem disso devendo saber também que quem sofre são os mais fracos, não os mais fracos dos países industrializados e desenvolvidos, mas aqueles que morrem no espaço de dias por causa de um aumento insignificativo no preço do petróleo. São centenas de milhões de pessoas que estão à beira da fome e da morte por causa destas práticas.
Não podemos estar à espera que sejam os interesses económicos a responsabilizar-se, mas podemos exigir ou recomendar às grandes organizações internacionais que façam alguma coisa.
- Li num lado qualquer que o correio electrónico foi criado para isso mesmo. -
Na verdade, o aumento do petróleo não se deve a uma menor produção, havendo até mais petróleo agora do que quando o preço do barril andava pelos vinte cêntimos. A escalada do preço do petróleo deve-se a dois meros factos: a desvalorização do dólar e a especulação. Da mesma forma, não podemos admitir que os cereais se tornem na nova galinha dos ovos de ouro de alguns, pois não constituem grande alternativa aos combustíveis actuais (não é alternativa em termos de performance como não é em termos ecológicos) e são a base da alimentação do Mundo, principalmente dos seus ocupantes mais necessitados, o que implica que essa seja a prioridade, e é possível fazê-lo estudando os transgénicos e estudando formas de distribuição mais eficazes. O problema da fome é um problema de distribuição e não de abundância.
Os governos da Europa, as Nações Unidas, como a Organização Mundial do Comércio ou outras organizações internacionais, têm culpa por omissão, mas é importante destacar na tomada de culpas da situação económica do Mundo o papel do Fundo Monetário Internacional, cuja infâmia na atribuição de apoios ou imposição de coimas tem sido causa de muitas manifestações e vozes de desagrado e, para variar, da Administração Bush e dos falcões que a povoam alimentando-se das guerras e do sofrimento do Mundo. É claro que há outras organizações (ecológicas, de assistência médica, humanitárias, etc.) que também se enredam nestas disputas, cabendo-lhes a elas uma parte da culpa, mas, de forma geral, são essas organizações que traduzem o sentimento de revolta que se generaliza e cabe-nos a nós partilhar, nem que seja através de uma mensagem para o correio electrónico de uma ou outra organização, a revolta. Podemos também diminuir substancialmente o uso de combustíveis fósseis ou no mínimo, deixar de abastecer nos principais fornecedores (parece que é já no princípio do mês de Junho que vai haver um boicote generalizado às grandes petrolíferas). Quanto a mim, que já boicoto o gasóleo há duas semanas, acho apenas que fazem falta mais protestos. Fica o meu.

(João Freire)

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