27/04/2010

Responsabilidades do futebol

O papel social dos opinion makers (fazedores de opinião, numa tradução literal da expressão inglesa), como o próprio nome indica, é o de construir uma opinião com a qual a generalidade das pessoas se possa identificar, ajudando a esclarecer e a informar as pessoas sobre determinados assuntos. Isso funciona para o Marcelo Rebelo de Sousa nos seus comentários políticos como funciona para os comentadores desportivos dos mais variados programas de discussão futebolística do nosso país. Todos devem saber o risco e a importância de tal função. As discussões que se têm em programas de televisão não ficam só pelos estúdios e corredores das estações televisivas, estendendo-se por todo o país sob os mais variados entendimentos - tantos quantas as pessoas que ouvem.

Esta semana vai haver um Porto-Benfica no Dragão e o clima de confronto entre os dois clubes está à vista de todos. Poderia ser pior, por exemplo, se os dois clubes estivessem pontualmente mais perto, mas mesmo sem esse ‘picante’ – que deveria entusiasmar mas que apenas preocupa quem gosta de futebol – as rivalidades estão exacerbadas.

Quem se responsabilizará se o jogo do próximo fim-de-semana se tornar num confronto físico entre as falanges de adeptos e as forças de autoridades?

Terão alguma culpa os comentadores que ao longo do ano futebolístico foram deitando achas e gasolina para a fogueira das sensibilidades clubísticas?

Haverá vários focos de responsabilização, desde logo nos presidentes dos dois clubes que transportam semanalmente as suas quezílias privadas para o terreiro público. Neste ponto, Pinto da Costa está pior, porque continua com o discurso palerma e obsoleto – que irrita e ostraciza até alguns portistas – do confronto Norte/Sul. Convém relembrar ao senhor Pinto da Costa que há portistas espalhados por todo o país e até pelo estrangeiro, pelo que não deve minorar o clube que preside.

Mas os comentadores também têm a sua quota de responsabilidade, “gente que, servindo-se de púlpitos privilegiados, não desperdiça a ocasião que lhe é oferecida semanalmente para incendiar ainda mais os ânimos entre as diversas hostes”*.

Quando se fala em “Andor”, “Calabotes”, “Palermo”, “Túneis”, ainda que antes se diga “que eu nem queria falar de”, num artifício de civismo, tem de ter-se a noção do que isso comporta aos ouvidos de espectadores mais incautos. Destaco Rui Moreira, que participa no Programa “Trio d’Ataque” da RTP, não por ser mais incendiário do que José Guilherme Aguiar, que participa no programa “O Dia Seguinte” na SIC NOTÍCIAS ou Miguel Sousa Tavares, que escreve uma crónica semanal do jornal “A BOLA”, mas precisamente pelo estatuto contrário que ele ostentava. Digo “ostentava”, porque no meu entender já não ostenta, visto que todas aquelas expressões atrás foram proferidas por ele, assim como a frase do jogo Benfica-Porto em que o “Benfica mereceu ganhar, mas ganhou sem merecer”. Ainda não sei ao certo se a imagem positiva que tinha dele era causada pela posição em que o clube que defendia se encontrava quase sempre, que era a de vencedor, e se esta nova imagem menos positiva, em que aparece associado a manifestações junto à Liga de Clubes com sócios que ameaçam “outras formas de manifestação” e insiste no recurso a insinuações, se deve ao facto de estar em terceiro lugar. No entanto, não é apenas ele. Destaco Rui Moreira, mas não o isolo.

Como disse atrás, todos sabemos da importância do papel que os opinion makers desempenham, eles também o sabem, e por isso não é despropositado que todos tentem tomar um papel activo na competição, mitigando as dificuldades ou acentuando as facilidades das suas equipas, através da força das suas palavras e na pressão que elas exercem nas mais variadas fontes desde os jogadores às comissões de arbitragem e disciplina, da Liga ou da Federação.

Mas terá de haver um limite para tudo o que é dito e feito para defender uma equipa de futebol.

Volto a perguntar: Quem se responsabilizará se o jogo do próximo fim-de-semana se tornar num confronto físico entre as falanges de adeptos e as forças de autoridades?

Há várias certezas no futebol em Portugal. Uma dessas certezas será a de que existem irregularidades das mais variadas montas, outra é a de que todos ou a maior parte dos clubes estão envolvidos nelas. Será tudo uma questão de nível.

Nestes casos, havendo provas, factos concretos ou o que seja, que se condene quem tem de ser condenado, responsabilizando sempre as pessoas e nunca os clubes. Julguem e apanhem todos os que têm de apanhar, recorrendo a todos os métodos que achem necessários para o fazer, mas não insinuem, nem falem de um passado antigo que não tem culpa dos erros presentes.

Resta ainda outra certeza, a certeza de que, apesar de movimentar muito dinheiro, influências, prestígio e poder, o futebol é apenas um desporto, com vencedores que vão alternando ao longo do tempo e dos confrontos dentro do campo. Ou assim deveria ser.

P.S. - É uma pena um dos melhores jogadores do campeonato ficar arredado do Clássico do próximo fim-de-semana.


+Citação de Antonio Boronha, retirada daqui.


(João Freire)

11 comentários:

João Roque disse...

Se o Benfica for campeão no Dragão, decerto haverá "barulho" em certos locais da cidade...

Moyle disse...

é o futebol à portuguesa. em tudo o que esta expressão tem de pior e de pior...

mz disse...

A comunicação social é tramada nestes casos... sempre a deitar achas para a fogueira!

Sou... sou! Benfica!
Mas não sou fanática... que ganhe sempre o melhor, independentemente da côr da camisola.

Johnny disse...

Pinguim, eu acho que haverá barulho, mesmo que o Benfica não seja Campeão, porque se não começam uns começam os outros... e não há inocentes nestas coisas.

Moyle, por um lado eu também gosto destas coisas de pancada e clubite aguda - tem a sua piada -, mas depois, como cidadão, acabo por achar mal, porque há sempre pessoas que não merecem que são apanhadas nestas confusões e há exemplos para crianças e há... certas coisas que fazem pensar e criticar comportamentos mais extremistas.

Mz, eu sou do mais faccioso que existe, mas só quando estou naqueles 90 minutos... às vezes um bocadinho mais! Mas depois acho que é só um jogo e acho que certos comportamentos, atitudes e palavras são desproporcionados.

Ginger disse...

Porque é que traduziste "opinion makers"? Até parece que o pessoal não ia perceber...

-.-'

Johnny disse...

Vícios de escrita de relatórios e de orientadores de estágio que me diziam que devia ser assim.

Sorry.

Pronúncia disse...

Gostei desta análise... quase, quase conseguiste ser isento!

Detesto opinion makers!

Dylan disse...

A MZ tocou num ponto essencial - a comunicação social. Como é possível jornalistas abdicarem da sua isenção e deitarem achas para a fogueira?! Como é possível que, na véspera de um embate deste nível, entrevistarem o grunho, chefe da claque portista? O que acham que ele vai dizer? Paz e amor?!...
Os recentes ataques às Casas do Benfica em Ermesinde e Fânzeres provam o ódio que nutrem pelo SLB. Vai ser um Domingo complicado. Esperemos que não seja um "Sunday bloody Sunday"! Quero ver quem vai acarretar com as eventuais culpas...

Johnny disse...

Pronúncia, admito que sim, que não tenha sido cem por cento isento, mas, pelo menos, tento... já os comentadores...

Dylan, as autoridades policiais admitem que esse grunho seja imprescindível no controlo da sua claque, no entanto, concordo que é errado dar-lhe atenção.

Dylan disse...

Imprescindível no controlo da sua claque?!

•"O BENFICA é o nosso inimigo mortal. Ponto de honra derrotá-los, dentro e fora das quatro linhas."


•Benfica - F.C.P = (1992) - "Depois da festa, foi o fim do mundo. Distribuímos pancada por tudo o que fosse vermelho." "Surgiu a ideia de criar os ultras portugal com elementos dos super dragões e da claque do Sporting. A primeira viagem foi contra a Itália.(...) No caminho, o Borrego lançou um concurso que consistia em ver qual era a claque que mais roubava (...) Foi o caos em Andorra! Lojas e mais lojas cheias de máquinas de filmar, roupa, tabaco...Tudo à mão de semear. Ficámos em transe."


•Corunha - F.C.P (2004) - "Resolvemos pôr-nos atrás do repórter a fazer de otários e a gritar "Porto". O cabrão manda desligar a câmara e diz: "estes gajos do Porto são sempre os mesmos palhaços...". Saltou-lhe tudo em cima. Levaram um tareão e sem telemóveis."


•Guimarães - F.C.P (1994) - "Houve um policia que se armou em esperto e deu uma bastonada num gajo. Veio outro por trás, deu-lhe uma sarda, ele ficou lá esticado."


•Braga - F.C.P (1995) - "Pelo que se comentava, muito do pessoal tinha notas falsas para comprar os bilhetes e ainda trazer troco."


•Setúbal- F.C.P (2002) - "Foi o caos! Entraram cem gajos pela área de serviço e roubaram tudo o que lhes apareceu à frente. Até que os guardas trancaram 16 (...) Foram todos absolvidos. Foi um final feliz."


•M.United - F.C.P (2004) - "Nunca vi uma coisa daquelas num free shop. Até montras de ouro tinha. Foram dez minutos. Uma rapadela total."


•Juventos - F.C.P (2001) - "Abri o cortinado das hospedeiras e vi o Alexio e o Caveira aos beijos e aos apalpanços (...) Os outros começaram a puxá-las, a dar-lhes surras no cu e a apalparem-nas... Depois, o co-piloto começou a falar comigo a explicar que tinham roubado a carteira ao comandante. Ele estava fodido e já queria aterrar o avião, antes do tempo! (...) Os cães sentiram o cheiro a ganza que os gajos fumaram durante o voo..."


•Corunha - F.C.P(2003) - "Só os vi em cima dele a disputarem o telemóvel, a camisola, as calças, o dinheiro. Quando me apercebi do que ele estava a dizer vi que era espanhol. Não queria acreditar que tinham raptado um puto de 17 anos. Os cabrões, como íamos de porta aberta, viram o chavalo e meteram-no para dentro do autocarro. Fiquei cego e enchi-os de porrada. "Vocês, são doidos! Se queriam roubar, roubassem antes de entrar".

Excertos do livro "O Líder", lançado por Fernando Madureira, líder da claque Super Dragões.

Johnny disse...

Ainda que num sentido distorcido, continuo a afirmar que ele poderá ser (e é) imprescindível para as autoridades da mesma forma em que os Talibãs e os líderes religiosos das aldeias do Afeganistão são imprescindíveis nas negociações pela paz no país, apesar de muitos deles serem responsáveis por outras atrocidades. Pensarão as autoridades que tê-lo ao lado é melhor do que o ter contra eles. Isto é o que eu acho, mas posso estar errado e, como disse, é pior dar-lhe atenção pública, nomeadamente em entrevistas e publicações de livros.

Obrigado pela informação histórica.