27/08/2023

Os químicos da felicidade

Habituámo-nos a estar sozinhos. A ideia de uma relação para a vida toda entre um homem e uma mulher que víamos nos filme e livros já não nos parece atraente e a facilidade de uma relação à medida que podemos pesquisar facilmente nos telemóveis de acordo com parâmetros pré-estabelecidos, é muitas vezes apenas aparente. As vontades muitas vezes não coincidem, a individualidade impera, surgem novas complicações que vão desde o simples iniciar da conversa, passando pela consideração que agora temos de ter com os pronomes, o género, a sexualidade, o tipo de alimentação, a filiação política entre milhares de outras coisas para as quais estamos mal preparados e que causam mais ansiedade do que interesse. É por isso que muitas vezes perdemos mais tempo na escolha do que na conversa e no desenvolvimento das ligações em si e apostamos mais em procurar pessoas para momentos, seja para viajar, para sexo casual, orgias, swinging, para jogar Quiz Planet ou apenas para conversar do que para relações a longo prazo. E mesmo quem acha que procura relações 'tradicionais' muitas vezes pondera se não estará melhor sozinho, porque dormir acompanhado parece uma boa ideia até que nos lembramos que tínhamos uma cama só para nós e porque a ideia de ter roupa ou pêlos espalhados por todo o lado assusta qualquer um, mas também porque, com tanta escolha à nossa disposição, é mais difícil aceitarmos qualquer comportamento por mais pequeno que seja que não compreendemos ou do qual não gostamos. E é por tudo isto que, apesar de contraditória, neste mundo tão ligado, parece haver uma tendência para a solidão. A solidão é cómoda. Não temos de nos preocupar com ninguém, partilhar nada, ajudar ninguém, fazer compromissos, nem sequer arriscar conhecer os familiares e se é verdade que não temos as regalias desse tipo de relações, também é verdade que não temos as complicações e arranjamos alternativas, chamemos-lhes sucedâneos da felicidade, seja a família, amigos, animais de estimação, o trabalho, as idas ao ginásio, as partilhas que fazemos nas redes e aplicações sociais ou o onanismo, claro, e que nos permitem as doses diárias daqueles químicos que nos fazem sentir bem.

(João Freire)

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